O MUNDO IRREAL DE AMANDA GURGEL

 02/06- Merecia uma foto1

Após a Praça Conde dos Arcos, atravessamos a  Av. EUA e andávamos com o forró pé de serra em direção aos Correios.  Sensata e civilizadamente, ocupávamos apenas uma das faixas da avenida, respeitando o direito dos outros cidadãos, nos carros. Aí, um dirigente (de terno) babatou o microfone e puxou a passeata para as duas faixas: venham, venham! Sabe como é, né? Segundos depois, uma dirigente já estava com as mãos no capô de um carro, requerendo o nosso direito de ir e vir. O carro não gostou.  A dirigente deu as costas, o carro pressionou e ela se virou com ar talvez já indignado. Aí, chegam o Chefe e um ex-diretor de secretaria (conheci-o bem) em apoio à  primeira dama.  O motorista se agita e alguém que não estava na frente do carro pede calma. E tinha de pedir mesmo porque a cara dos que barravam os carros … A do Chefe, então… E sem uma palavrinha sequer,  viraram as costas ao motorista  e seguiram a um metro um do outro, de mãos dadas.  O pior é que não havia  nenhuma loja por perto vendendo desconfiômetro!

Meu deus, o “trabalhadores na rua, Dilma a culpa é sua” era em busca de apoio ou rejeição da sociedade? Tudo bem, tinha muita mulher bonita na passeata, mas precisava parar o trânsito?

Merecia uma foto2

Era jovem, bonita, parecia educada e nova em um dos tribunais. Seria formada em Direito? Tomara que não. Não é que essa filha de deus – durante a parada em frente ao Correio – embolou a embalagem plástica que acabara de esvaziar e a jogou no chão, ainda limpando a boca? Pois é. Que poder público pode manter uma cidade dessa limpa, né? A galera do microfone precisa se ligar.

 post relacionado: CONSELHO DE ÉTICA

ENQUETE4

 …………………………….O MUNDO IRREAL DE AMANDA GURGEL

“…qualquer consideração que seja feita aqui é apenas para mascarar uma verdade, que é uma verdade visível a todo mundo (…) Em nenhum governo, em nenhum momento (…) a educação foi uma prioridade (…) Estamos aceitando a situação precária da nossa educação como uma fatalidade? Estão me colocando dentro de uma sala de aula com um giz e um quadro para salvar o Brasil, é isso? Não posso, não tenho condições. Muito menos com o salário que recebo (…) Penso que o constrangimento deve vir de vocês…”

Vídeo obrigatório: http://www.youtube.com/watch?v=yFkt0O7lceA

Você se constrangeu, leitor? Por favor, diga que sim. É só do que este país precisa:  vergonha. Talvez, não tanta quanto a da China, que, com o seu capitalismo de sec. XIX (veja  QUEM RESPONDE?) ocupa o 1º lugar no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Produzido a cada três anos, esse estudo avalia a educação de 65 países, no mundo. O Brasil ocupa a 53ª colocação, atrás de Trinidad e Tobago, Colômbia, México e Uruguai. Para nós, um pouquinho da vergonha do Chile ou até da África do Sul, onde o salário médio do professor era de R$2.300,00 (dois mil e trezentos reais) na época da copa (http://www.youtube.com/watch?v=jgxryAVxdjc), talvez já permitisse que profissionais da grandeza moral de Amanda Gurgel não mais fossem constrangidos, pelo menos, pelo Ministério Público local (RN). Como?

Segundo o depoimento que caiu como um raio sobre o maior drama brasileiro, deixando sem ar o poder público local,  a internet e vários programas de TV, o MP potiguar – na sua condição de fiscal da lei – instou os professores a não se alimentarem do cuscuz destinado à merenda escolar. No vídeo inaceitável para uma sociedade que

      • se gaba de ser a 7ª economia do mundo;
      • tem os mais bem pagos parlamentares da terra, cujos bolsos não conhecem  lei,  nem mesmo de responsabilidade fiscal;
      • pensa em trem-bala e grandes palcos para copa e olímpiadas;
      • doa e/ou empresta a países da África, Caribe, Uruguai e até ao FMI;
      • e ainda é campeão de concentração de renda (Palocci é só um caso) e corrupção,

a professora Amanda, apesar da graduação superior e especialização, falou em “930,00reais por mês e “cuscuz alegado”. Esse é um perfil de país que vai realizar as conquistas civilizatórias indispensáveis para, em 20 anos, colocar-se entre os grandes, leitor (veja NADA É TUDO, EXAME DE CONSCIÊNCIA,  CONSELHO DE ÉTICA)? Calma: só responda se ficou constrangido, para parafrasear a professora e o seu fino fio de nylon com que paralisou o gogó de deputados e autoridades naquela audiência pública. Convém, também, não responder sem antes dar uma olhadela no Chile. Na edição 379 do Falajuf (http://www.asserjuf.org.br/falajuf2011/379.pdf), um colega da Justiça Federal narra a sua passagem recente por aquele país e destaca:

…fiquei feliz em descobrir que Santiago é uma cidade limpíssima, extremamente organizada, cheia de praças, parques, jardins, museus e igrejas e muita história de um povo educado, hospitaleiro e muito orgulhoso. Fiquei impressionado com a riqueza cultural de um país que já teve dois prêmios Nobel de Literatura (Pablo Neruda e Gabriela Mistral). O Brasil ainda tem zerinho (dê uma olhadinha em DICIONÁRIO AMOROSO DA AMÉRICA LATINA) (…) Santiago tem o primeiro jornal da América Latina e ainda está em atividade, e também foi a cidade que teve a primeira linha de trem do continente. O país tem taxa de analfabetismo de 3%, desemprego em 7%, inflação de 4% ao ano e salário mínimo de 350 dólares (…) me chamou a atenção que o fardamento dos estudantes é o mesmo, sejam de escolas públicas ou particulares. Uma forma de evitar qualquer discriminação…

(Por que essas matérias não aparecem nos meios do Sindjufe, meu deus? Estranho, né? Podre e poder são tão parecidos, né? Sem Democracia, apodrece, mesmo)

Voltando: lembra de

“… quando as sociedades chamaram a si a responsabilidade de realizar as suas potencialidades, explorando-as para realizarem-se a si próprias (e não ao estado, classe ou casta), desenvolveram-se. Quando não, os elementos externos foram apenas mais um obstáculo…” (veja A RIQUEZA E A POBREZA DAS NAÇÕES)?

Pois é: valores, visão de mundo e mentalidade, por mais abstratos que pareceriam às certezas concretas que o vento levou (veja VOCABULÁRIO DE IDEIAS PASSADAS), contam muito. Talvez até mais do que riqueza no chão, como se demonstra pela Ásia, região da terra onde talvez mais se invista em educação. Você notou em “… Santiago é uma cidade limpíssima, extremamente organizada, cheia de praças, parques, jardins, museus e igrejas e muita história de um povo educado, hospitaleiro e muito orgulhoso…”, leitor? Dá uma inveja, né? E em “… me chamou a atenção que o fardamento dos estudantes é o mesmo, sejam de escolas públicas ou particulares. Uma forma de evitar qualquer discriminação…)? É uma pena que O EXEMPLO VIZINHO não nos inspire tanto.

Em matéria recente, aliás, a mal falada Veja (http://veja.abril.com.br/acervodigital/home.aspx) olhou para lá. Veja o que podia ter sido feito nos 16 anos de FHC e Lula, se exigíssemos :

“(…) Na última década, ninguém avançou tanto em sala de aula quanto os chilenos. Eles se destacam na comparação com estudantes de 65 nacionalidades, inclusive os brasileiros, segundo revela um recente levantamento conduzido pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)

(…) O mérito do Chile foi aplicar com disciplina e persistência iniciativas de eficácia já testadas, com sucesso, em países desenvolvidos. Elas só funcionaram porque permaneceram de pé ao longo de duas décadas ininterruptas – a salvo de trocas de poder, ideologias e ingerências políticas que costumam provocar retrocessos na área. No início dos anos 1990, governantes de diversos matizes ideológicos selaram uma espécie de pacto nacional, alçando a educação ao topo da agenda política, numa época em que o país acabara de sepultar a ditadura do general Augusto Pinochet

(…) O motor das mudanças chilenas se alicerça em uma premissa tão básica quanto eficaz: a meritocracia. Tal ideia é levada no Chile às últimas consequências – a ponto de gente como Maria Dolores Ormazabal, 57 anos de vida e 28 no ofício de professora, ganhar 30% mais que seus pares por se destacar no trabalho. Depois de mais de uma década de negociações com os sindicatos, todos os docentes chilenos passaram a ser submetidos a avaliações periódicas, que podem até sentenciar a demissão dos menos eficientes

(…) Os diretores também passam por criteriosa peneira. Um pré-requisito para que sejam contratados é a apresentação de um plano de gestão para a escola que pleiteiam comandar, tal qual numa empresa. Os mandatos, de cinco anos, só são renovados mediante bom desempenho, o que os deixa em permanente vigilância

(…) Outro traço marcante da reforma chilena é o pragmatismo com que se faz uso do dinheiro público. O Chile elevou o quinhão destinado à educação – de 2,5% para 6,4% do PIB desde 1990, enquanto o Brasil estacionou em 5% -, mas só libera certas verbas em troca de resultados concretos, mensuráveis. Um deles é elementar: o comparecimento dos alunos à sala de aula. O segundo é que a escola siga em trajetória ascendente, segundo indicadores objetivos, ano a ano. Os recursos têm sido canalizados para o essencial. As escolas mantidas com orçamento oficial – algo na casa de 95% das escolas do país – contam hoje com turno de oito horas. É uma das características que aproximam o Chile dos países mais ricos e bem-sucedidos na educação

(…) Tais avanços se traduzem em uma coleção de boas histórias, como a que conta o estudante Ignacio Gonzalez, de 14 anos. As lembranças mais vivas que traz do período escolar são de quando ele e os colegas escalavam um muro no fundo do pátio, para escapar da aula. Hoje, o rapaz diz: “Pela primeira vez na vida, ir à escola passou a ser um prazer”.

Pode ser uma pregação ideológica da revista? Pode e deve. Mas, não esqueçamos que ela está se referindo a um país que, se não me engano, teve dois períodos seguidos de política de esquerda, aliás, internamente criticada (http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI2689254-EI6580,00.html), talvez não tanto quanto a atual (http://diarioliberdade.org/index.php?option=com_content&view=article&id=15590:25000-estudantes-exigem-nas-ruas-de-santiago-de-chile-a-recuperacao-da-educacao-publica&catid=283:linguaeducacom&Itemid=185 )

Claro que, depois de FHC e Lula (o que estava para trás era o lixo do lixo, não era?), ficou mais difícil envergonhar-se, no Brasil. Claro que, lá dentro de você, leitor, além do natural “não tô nem aíde quem conta com o desconto no imposto de renda da escola que “paga, algum passado está corretamente dizendo que outras Amandas falaram a mesma coisa para chegar ao poder (e, descaradamente, se lambuzarem dele). Você pode até dizer que ela teria usado competentemente a tribuna dos deputados para lançar-se, ao menos, à carreira sindical, o que, reconheçamos, não seria imerecido (quem dera fosse esse enganoso mundo feito só de Amandas, Heloisas...) Mas, meu amigo (quase ia dizendo, “companheiro), pelo silêncio, mal-estar e repercussão, há de se admitir que a digníssima professora de R$ 930,00 por mês não fez um mero discurso “político”, como se diz na gíria.

Com os seus menos de dez minutos de seriedade, elegância, indignação, bom português e sotaque lindo, ela falou como gente (não como máquina), exumou a educação brasileira e lhe fez o exame de DNA. Como cidadã (em grego, politikós), ela fez Política (politikón: administração, projetos, leis … democracia...; veja A GUERRA QUE ELES NÃO PODEM PERDER). Ela encantou a TV e o mundo virtual. Encantará, algum dia, a sociedade civil? Antes terá de encantar a vida sindical. Conseguuirá?

Veja, também:

 TRÊS RAZÕES e UMA ESCOLA

ÉTICA NÃO É IDEOLOGIA

FALSIDADE IDEOLÓGICA?

MADE IN URUGUAI

A ERA LULA- parte 1

A ERA LULA-parte II

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